segunda-feira, 28 de maio de 2018

O debate sobre o final da vida

Um excerto do artigo de opinião de Paula Martinho da Silva, advogada e antiga presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, publicado hoje no jornal "Público", com o título "A luz que começa a morrer (uma reflexão sobre o final da vida)". Com a devida vénia,

«O final da vida não tem partido, religião, idade, movimento cívico. Por isso devemos falar sobre o tema abertamente, sem etiquetas e sem complexos. A morte deixou de ser a “morte natural” e passou a ser a “morte medicalizada”: mais de metade dos portugueses morrem hoje nos hospitais. Muitas vezes sós, muito sós. Com dor desnecessária, com desconforto, sem serem escutados, com medo daquela “luz que começa a morrer”.

O debate sobre o final da vida tem-se centrado sobretudo na dignidade humana e no confronto entre os princípios da inviolabilidade da vida e da autonomia da vontade. Lamentavelmente, não se focou na necessidade de promover os instrumentos de decisão e o diálogo médico-paciente, nem no acesso equitativo aos cuidados de saúde, nem no acompanhamento familiar e hospitalar do doente em final de vida.

Partiu-se rapidamente para a via legislativa, como se todos os caminhos estivessem percorridos e esgotados e, muitas vezes invocando que “o debate em sociedade já foi realizado”, apresenta-se a eutanásia e o suicídio assistido como “a” solução.

Então, por que é que as mais recentes tentativas internacionais para legislar sobre eutanásia foram rejeitadas?

O anterior Presidente da República francês, François Hollande, e o seu Governo socialista souberam interpelar a sociedade, e entender que o mais significativo ainda estava por cumprir: respeitar a vontade de cada um nas decisões sobre a sua saúde, aliás já consagradas na lei, mas raramente cumpridas.

Em Inglaterra, exemplo de país europeu na vanguarda do progresso científico, o Parlamento, em 2015, rejeitou maioritariamente a alteração da lei que despenalizaria a eutanásia. O Parlamento finlandês acabou de rejeitar há poucos dias um projeto lei de legalização da eutanásia. Continuam assim sós, na Europa, os mesmos três países onde é permitida a prática da eutanásia e do suicídio assistido (Bélgica, Holanda e Luxemburgo), a que se junta a Suíça (onde só é permitido o suicídio assistido).

Naturalmente que os debates continuam, como, aliás, é esperado em temas que estão longe de ser consensuais e sobre os quais existem profundas dúvidas e divergências.».../...

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