segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Um simulacro de referendo na Catalunha

Artigo de opinião de Francisco Sarsfield Cabral, intitulado "Um simulacro de referendo", publicado hoje no portal da Rádio Renascença. Com a habitual e muito merecida vénia,

«Rajoy caiu na armadilha de tomar medidas violentas que atraem catalães moderados para a causa da independência.

O alegado referendo de ontem, na Catalunha, foi anticonstitucional e ilegal, como é óbvio. As irregularidades multiplicaram-se, desde desrespeitar o próprio regimento do parlamento catalão até permitir que ontem vários partidários da independência votassem mais de que uma vez, havendo quem votasse quatro vezes...

Em editorial anterior à votação, o jornal “Le Monde” classificou a votação de referendo inútil. Mas não foi inútil para os independentistas.

A insatisfação na Catalunha quanto ao governo de Rajoy acentuou-se em 2010 quando o Tribunal Constitucional de Espanha, a pedido do PP (de Rajoy), cortou uma série de poderes previstos no estatuto autonómico que os catalães haviam apoiado em referendo.

Depois disso, nunca o executivo de Rajoy se dispôs a negociar com a Catalunha um novo estatuto. Em 2012, pela primeira vez, as sondagens indicaram haver na região uma maioria favorável à independência.

Mas, a partir daí, a opção pela independência perdeu popularidade. Na última sondagem antes do presente caso os independentistas baixaram para 35%. Região rica, atraindo muitos trabalhadores de outras zonas de Espanha, a causa da independência arriscava-se a ter na Catalunha cada vez menos adeptos.

Por isso, os líderes pró-independência encontraram uma maneira de inverter a tendência: um “referendo” ilegal, que levasse Madrid a tomar medidas violentas susceptíveis de reconquistar catalães moderados para a causa independentista.

Por inépcia política, Rajoy caiu na armadilha.

Barcelona e boa parte da Catalunha a certa altura pareciam um território ocupado por forças estrangeiras. Uma imagem que beneficiou, também, da clara cumplicidade de muitos jornalistas estrangeiros, incluindo portugueses, na cobertura dos acontecimentos.

E Madrid não soube distinguir entre os catalães que querem a independência e os que a rejeitam, mas exigem votar.

Agora será bem mais complicado resolver o conflito. Certamente que pouco se avançará enquanto Rajoy for primeiro-ministro. E enquanto permanecerem em funções os promotores catalães deste simulacro de referendo.»

Sem comentários: