Marca aí na tua agenda

«– Já tens agenda?
– Agenda ou calendário?
– Agenda.
– Agenda não uso desde que tenho telemóvel. Mas usava uma daquelas bem gordas, de capa dura e elástico à volta, chamávamos-lhes filofax, lembras-te?
– Toda a gente tem uma agenda. Uma coisa que aprendi nos últimos tempos é que toda a gente tem uma agenda.
– Olha, eu não tenho, mas calendário gosto sempre de ter um. Normalmente dão-me na farmácia ou no restaurante chinês, se bem que o do chinês às vezes traz as datas trocadas, a pessoa fica toda baralhada. É como isto das estações. Não tenho memória de um Natal tão quente, eles bem dizem que é tudo treta a conversa da cambada do ozono mas eu...
– Camada do ozono.
– Camada do ozono.
– O Marcelo tem uma agenda, a Maria de Belém tem uma agenda, olha que até o padre comunista tem uma agenda. É impressionante isto...
– E quem é que lhes dá as agendas? Ou compram?
– Não percebes? Eles fazem a sua própria agenda, a partir do que pretendem e do que acreditam vir a conseguir. Resta saber se a agenda deles é a mesma que a do País.
– Qual país?
– Portugal, qual é que haveria de ser?
– Portugal tem uma agenda? Essa é que eu também não sabia. E aposto que a capa é uma fotografia da selecção nacional. Olha, até estou capaz de comprar uma. Haverá disso na Fnac?»

(Crónica de Dulce Garcia, subdirectora da revista "Sábado", intitulada "Marca aí na tua agenda", publicada no dia 7 de Janeiro de 2016)