«O
sindicalista Mário Nogueira estava ontem na Guarda, manifestando,
enquanto o Presidente Cavaco Silva discursava. A coisa assim, dicotómica
e seca, só pode ter uma interpretação política democrática: ainda bem. O
Presidente usando a sua prerrogativa de eleito, falar em nome do povo, e
o sindicalista da regalia de cidadão, protestando. Ambos no seu
direito. Mas mais fundo na análise - para lá dos direitos gerais dos
protagonistas - há que reconhecer um paradoxo. Não em Cavaco Silva, que é
um homem desta situação política, coerente com o que fez (certo ou
errado, não interessa aqui), desde que foi reeleito, em janeiro de 2011.
Ele, pois, no lugar consequente. A bizarria estava no outro, em
Nogueira, também ele homem do "regime". Aliás, poucos como ele nos
levaram ao Governo que temos e à política que aconteceu depois de 2011 e
era consabido, antes, que viria a acontecer. Não me interessa se
Nogueira estava errado ou não no passado recentíssimo, organizando na
rua o Governo PSD-CDS que iria chegar: só estou a tomar nota do paradoxo
dos protestos dele, agora. Dito isto, que é só mais uma ambiguidade
própria da política, passemos às regras de civilidade. Quando
discursava, Cavaco Silva desmaiou. Perante um homem que desmaia, um
homem que lhe berra cala-se. Nogueira continuou a berrar. E a dúvida que
se lhe pode pôr na política - ele presta-se à direita ou à esquerda? -
fica desfeita na vida geral: simplesmente ele é sem préstimo.»
(Artigo de opinião de Ferreira Fernandes, intitulado "O desmaio e o homem sem préstimo", publicado no jornal "Diário de Notícias" de hoje)
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