segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Afinal, os britânicos não sabiam o que significava o Brexit...

Com a devida vénia, eis o artigo de opinião de Manuel Carvalho, publicado hoje no jornal "Público", com o título "O futuro do Reino Unido na dependência de um logro",

«O arrependimento dos que votaram no Brexit parece estar a crescer. Perceberam que cederam ao engano e caíram num logro. Pode um país desenhar o seu futuro assim?

Quando foi escolhida pelo seu partido para liderar o Reino Unido na ressaca do referendo que ditou o abandono da União Europeia, Theresa May garantiu que a escolha dos cidadãos seria respeitada, que não haveria um segundo referendo, que Brexit significa Brexit e ela se encarregaria de cumprir essa máxima. Dois anos depois, os eleitores de muitos dos círculos que se pronunciaram pela saída mudaram de opinião. Afinal, os britânicos não sabiam o que quer dizer Brexit e depois de perceberem o que pode estar em causa não escondem o seu arrependimento pela sua deliberação. Fará sentido reabrir a discussão? É possível convocar um novo referendo?

A primeira questão que importa suscitar é sobre o formalismo dos processos de decisão numa democracia. Um referendo serve para vincular a vontade política de uma nação e é muito sensível pretender esvaziar a sua solenidade e o seu resultado apenas por haver suspeitas de que, entretanto, a opinião pública mudou de ideias. Se até Março de 2019, quando o período de transição se inicia, acontecessem eleições e se a vitória coubesse, por exemplo, aos Liberais, partido desde sempre vinculado à UE, poderia haver outra legitimidade para anular o Brexit. Mas como esse cenário parece difícil, a saída do Reino Unido só será suspensa se a pressão dos cidadãos obrigar o Parlamento a um novo referendo ou a uma consulta sobre os termos do acordo final para a saída.

Para quem, como nós, pensa que a Europa sem o Reino Unido será mais pobre, menos influente e menos sensível aos interesses atlânticos que Portugal partilha, o ideal seria a repetição do referendo. E para os próprios britânicos também porque há motivos para acreditar que a decisão de há dois anos foi distorcida pela desinformação dos trolls manipulados pelos agentes do populismo e das democracias iliberais do Leste, pelas notícias falsas e pela demagogia. O referendo de Junho teve um lado de farsa e de engano que é cada vez mais percebido pelos cidadãos. Decidir o futuro do país com base nessa sensação de logro deve levar os agentes políticos a reflectir. Viver a incerteza de um futuro determinado por uma decisão carente de racionalidade e de transparência promete gerar um trauma de custos inimagináveis. É melhor não correr riscos.»

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