«Há dias, e durante quase uma hora, Adriano Moreira emprestou à
televisão portuguesa a inteligência, a sabedoria, a coragem que lhe têm
(a ela) minguado. A convite de Constança Cunha e Sá (soberba no seu
jornalismo interventivo), o antigo presidente da Academia das Ciências
de Lisboa esteve na TV24 – como outrora nos estimulantes noticiários de
Mário Crespo – lúcido e frontal, comunicativo e afectivo. E
(deliciosamente) irónico: “É preciso ser muito sábio para conhecer um
caminho único”, enfatizou a propósito de afirmarem que não há
alternativas ao “liberalismo repressivo” em curso.
“A presunção de inocência não existe para o Estado”, sublinhou:
“Paga-se primeiro, e só depois se é ouvido. A dignidade das pessoas não é
reconhecida. Dizem--nos que não há dinheiro – e princípios? Apagar o
Estado social é apagar os princípios!” De “país exíguo”, no passado,
passamos a “país protectorado”, no presente. Isso provoca “o afastamento
progressivo das populações dos governos”, que se exprime na “abstenção
crescente”, no “aparecimento de partidos antieuropeus”, de “grupos não
controlados por organizações, como as sindicais”, de “revoltas de
jovens”, etc.
Aliás, “estamos em risco de ver terminar um longo período de paz”.
Outra preocupação: “A pobreza está a desaparecer e a dar lugar à
miséria.” O governo “devia ser o guarda da legalidade, mas quem guarda o
guarda?” Num jeito a lembrar Agostinho da Silva (que muito o admirava),
Adriano Moreira lembrou que quem “ataca a comunidade dos afectos ataca a
unidade nacional”, o que está a ser (veja--se a culpabilização dos
idosos e dos funcionários públicos) indecentemente fomentado entre nós.
Estão a transformar-nos “num cemitério”.»
(Crónica de Fernando Dacosta intitulada "Um cemitério", publicada no "Jornali" de ontem)
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