(Editorial da jornalista Ana Sá Lopes publicado no jornal "iOnline" em 6 Ago 2014)
«Reler
o prospecto do último aumento de capital do BES à luz dos últimos
acontecimentos é um exercício de choque e pavor, agravado evidentemente
para todos os que decidiram investir e hoje estão remetidos ao “banco
mau”.
A operação teve o aval da Comissão de Mercados de Valores Mobiliários
mas, ainda que a CMVM seja obrigada a aprovar o prospecto – “verificar a
sua conformidade com as exigências de completude, veracidade [...] e
licitude da informação”, segundo o n.o 5 do art.o 118.o do Código de
Valores Mobiliários, isso não significa que seja responsável pelas
mesmas coisas logo dois artigos depois. Ora veja-se o n.o 7 do art.
118.o, que estabelece que “a aprovação do prospecto não envolve
“qualquer garantia quanto ao conteúdo da informação, à situação
económica ou financeira do oferente [...] à viabilidade da oferta ou à
qualidade dos valores mobiliários”. Assim, a CMVM garantiu a
“veracidade” e a “licitude da informação”, mas não tem de dar qualquer
garantia do “conteúdo da informação” e pelos vistos muito menos
relativamente da “qualidade dos valores mobiliários”. Isto é o que está
na lei. A aprovação da CMVM é igual ao litro e Carlos Tavares pode lavar
as suas mãos, porque ninguém neste país regula lá muito bem. Foi com a
total impunidade que o BES foi vendido àqueles que seriam os seus
últimos “bons” accionistas como o banco exemplar da economia portuguesa
nas barbas da CMVM e do Banco de Portugal que neste processo estão a
fazer de anjinhos.
Mais grave: na tentativa de salvar a pele, Carlos Costa veio informar
os portugueses que tinha detectado fraudes no BES em Setembro de 2013.
Vai fazer um ano. Se assim foi, Carlos Costa tem de explicar aos
portugueses o que andou a fazer este tempo todo. Aparentemente não andou
a regular bem.
Os pequenos accionistas que foram ao aumento de capital e agora ficam arrasados no “banco mau” também são contribuintes e confiaram na palavra dos reguladores, que sempre apresentaram o banco como o divino Espírito Santo. A catástrofe Espírito Santo é um caso de polícia, naturalmente, cheio de lições sobre a ganância financeira, a irresponsabilidade da banca, a inacreditável relação de abuso e confiança com o poder político e com empresas amigas. Mas é mais uma vez a prova de que em Portugal não se regula bem. E se o sistema financeiro não consegue regular bem, o problema não está nos banqueiros – é um problema de exclusiva responsabilidade política.»
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